No Café com Fé dessa quinta-feira, Adriano Dutra conversa com o jornalista e professor Carlos Alberto Di Franco, e discutem sobre a ética e o discernimento crítico no jornalismo e falam sobre os desafios que os meios de comunicação precisam enfrentar hoje e como devem informar com isenção.

Di Franco, que é doutor em comunicação pela Universidade de Navarra e Presidente do Conselho do ISE Business School esclarece que «esses momentos de disrupção digital impõem um enorme desafio, mas, ao mesmo tempo um desafio fascinante». De alguma forma, a mídia tradicional perdeu a hegemonia.

O publico da mídia tradicional é disputado sobretudo com as redes sociais e isso implica um desafio enorme num setor que vive uma crise no modelo de negócios e ao mesmo tempo uma oportunidade que traz embutida em si uma necessidade de fazer um jornalismo com mais qualidade, mais ético e mais verdadeiro.

«O desafio é imenso», alerta Di Franco. «Em primeiro lugar há um crise no modelo de negócios. A publicidade teve uma queda imensa e não vai voltar» e o jornalismo é essencial para o funcionamento da democracia. Ainda que, com menos recursos, com diminuição de pessoal e tendo que desenvolver um produto de mais qualidade.

Um provocação lançada por Di Franco é que «hoje é muito difícil se pensar num jornalismo puramente generalista. Hoje, nosso desafio é falar de menos coisas, mas com mais profundidade, com mais objetividade, e com mais capacidade de análise, de sorte que nosso consumidor perceba que o produto que estamos ofertando pra ele é um produto relevante para sua tomada de decisão».

Ao falar sobre as redes sociais, Di Franco acredita que seu advento é algo fantástico.  Elas fizeram com que a mídia tradicional perdesse o protagonismo e tivesse a competência de outro segmento, «que em si é uma coisa positiva». O jornalista também observa que os agentes proprietários das mídias sociais passaram a controlar aquilo que é postado. Para ele, «Esse espaço já não pode ser considerado um espaço de liberdade.

«Por outro lado, eu creio que há um certa fantasia em torno das mídias sociais, a agenda publica não é determinada pelas mídias sociais, mas é determinada pelas mídias tradicionais», ensina Di Franco. «O que eu falo com meus amigos está sempre vinculado a uma matéria da mídia tradicional. A mídia tradicional ainda dá o ponta pé inicial e as mídias sociais repercutem».

Di Franco observa que a mídia está se afastando do factual. A mídia está «deixando de produzir jornalismo informativo, ir a rua, ouvir as pessoas e depois editar e contar uma boa história fundada em fatos objetivos e reais». «O que estamos vendo é a mídia envolvida em uma narrativa que ela está convencida de que é a mais correta».

Carlos Alberto Di Franco – nosso entrevistado

Segundo o professor, a mídia está perdendo um ativo fenomenal. «O consumidor não quer a opinião ou a narrativa da mídia. O editorial é muito importante, é muito importante uma opinião, magnânima, qualificada, oportuna, mas essa opinião não pode fazer um contrabando opinativo na informação. Informação tem que ser claramente informação e opinião tem que ser claramente opinião», afirma.

Para Carlos Alberto, a neutralidade dos meios de comunicação não existe. «Todos nós temos posição na vida e a mídia também. O que se espera da mídia é a isenção na cobertura do fato, isso é uma exigência ética».

Ao referir-se a essa radicalização do jornalismo, Di Franco relembra que, também, os Estados Unido estão mergulhados no mesmo fenômeno de radicalização que acontece no mundo inteiro. «Você pega um jornal New York Times de 10 ou 15 anos atrás, sempre foi um jornal que defende as teses do partido Democrata e não o Republicano, no entanto, em sua cobertura, sempre foi um jornal plural, que abria suas páginas a vozes contrapostas. Isso já não acontece e é um empobrecimento enorme quando vc percebe que, na informação, o New York Times já embute um viés.

Di Franco defende a necessidade de se resgatar esse valor ético fundamental do jornalismo que é a opinião perfeitamente identificada e o fato coberto com isenção, com imparcialidade.

«O jornalismo é uma profissão fascinante, que atrai muito e o resultado desse fascínio é que, em geral, o jornalista tende a viver num mundo dele». Mas, o problema ocorre quando o jornalista vive nesse mundo e não sai para ver a vida real. «Jornalismo real tem cheiro de asfalto», ensina Di Franco. «Quando você só fala com seus pares, um reforça a posição do outro. Vivemos um momento de bolhas».

Carlos Alberto Di Franco, que também possui um canal no YouTube diz que quando convida uma uma pessoa para uma entrevista, essa pessoa sabe que será uma entrevista com independência. «Ressalto os aspectos positivos, levanto os aspectos negativos, isso é fundamental recuperar no jornalismo».

Sobre o sensacionalismo nas notícias, Di Franco reflete que «no jornalismo, ao longo do tempo, foi-se criando a mentalidade de que o rabo abana o cachorro. A notícia que vende é o que foge do normal. É o avião que cai, não é o avião que chega». Contudo, ele identifica uma «demanda reprimida, intensa e forte, por boas notícias».

«A vida, como um quadro, é feita de luzes e sombras. O jornalismo tem que cobrir a vida com suas luzes e suas sombras», destaca Di Franco. «Se eu cubro só as luzes, estou fazendo um jornalismo cor de rosa, que é absolutamente sem nenhuma importância. Eu preciso mostrar a corrupção os dramas, a fase sombria da vida e isso não significa que eu oculte o aspecto luminoso da vida».

Ao ser perguntado sobre as práticas de «cancelamento» que ocorrem nas mídias sociais, Di Franco explica que isso é «uma maneira de expulsar as pessoas que não pensam como nós do espaço. E, o mais surpreendente é que as pessoas que adotam as táticas de cancelamento, a fazem em nome da democracia. Hoje a democracia é muito mal tratada, ela é uma ferramenta para o totalitarismo das minorias, que impõem à maioria da sociedade, que tem valores, que tem princípios, tem raizes cristas muito solidas… em função de narrativas construídas de maneira  pouco correta, uma agenda que não é a agenda sociedade brasileira. É a inversão da democracia».

«No fundo estamos claramente em uma guerra cultural», revela.

Pe Rodrigo Hurtado, LC, fundador do Instituto Católico de Liderança e criador do aplicativo Seedtime, pergunta a Di Franco como desenvolver um sentido critico para julgar as noticias que lemos. Que critérios usamos para discernir as fake news com as noticias verdadeiras?

«As fake news são um fenômeno mais vinculado às mídias sociais», responde Di Franco. Ao se deparar com uma noticia que parece falsa, o leitor deve ir a um site de algum veículo de comunicação para ver se aquilo aparece lá, se tem algum fundamento. Carlos Alberto também reforça que há que se ter cuidado, «porque, às vezes, temos uma posição política determinada e tudo o que sai do outro lado é um assunto para bater. É preciso ouvir mais fontes, sobretudo antes de compartilhar».

«Hoje, com as mídias sociais, o mundo ficou pequeno. Somos capazes de, sentados na sala, entrar na biblioteca do congresso americano, podemos entrevistar uma pessoa na russia. As fronteiras ruíram diante do mundo digital. Precisamos ir direto na fonte».

Ao ser questionado sobre qual seria a melhor postura de uma pessoa de fé, ele responde que, em primeiro lugar, «a atitude de uma pessoa de fé é olhar as pessoas, com respeito e boa vontade. Na minha experiência pessoal, ao longo da minha vida, eu encontrei poucas pessoas más. Encontrei pessoas no desvio em função da ignorância, da falta de informação e, evidentemente, isso gera um problema muito menor. Mas, encontrei pessoas que estão numa linha ou numa encruzilhada que, do ponto de vista cristão, não é a mais correta, mas estão convencidos daquilo. Não podemos adotar uma postura quixotesca, de apontar o dedo para todo mundo».

Di Franco ensina que «temos que ter uma postura de caridade e de muita clareza, defender a verdade não significa agredir defendendo a verdade. Significa defender a verdade, com respeito, com afeto, com carinho. O carinho pode muito mais que a agressividade».

Ao ser questionado sobre sua visão em relação à formação do jornalista, Di Franco entende que «as universidades brasileiras, na área especifica da comunicação, são, a meu ver em grande parte, fracas. A faculdade de jornalismo tem que ter uma formação humanística muito sólida, uma formação antropológica muito sólida, uma cultura geral muito boa. Um jornalista que conhece história está melhor apetrechado para interpretar os fatos».

As universidades brasileiras, especialmente as faculdades de comunicação, «foram bastante dominadas por uma formação de matriz marxista, inclusive rasa», percebe o entrevistado. «Você tem gente que é de uma esquerda com pouco fundamento». Para Di Franco o desafio é resgatar essa formação mais profunda, mais humanística, mais sólida, que habilite o comunicador que exerce uma função tão importante, tão influente para poder transmitir a informação de uma maneira séria, qualificada.

«Eu sou um defensor total da liberdade de imprensa e da liberdade de expressão», exclama Di Franco. «Os benefícios da liberdade de imprensa e da liberdade de expressão são incomensuravelmente superiores aos riscos dos eventuais desvios ou excessos no exercício dessa liberdade». Excessos que são perfeitamente controláveis pela legislação ordinária brasileira».

Di Franco afirma que «sempre que se toca a liberdade de imprensa e de expressão, o preço que a sociedade paga e muito alto».

Pe. Rodrigo Hurtado, ao participar no Podcast pelo chat do YouTube, reforça que «o jornalista é um criador de opinião, forma e orienta as pessoas. Nesse sentido todo jornalista católico deveria ter uma boa formação filosófica, teológica e antropológica, coerente com sua fé».

Di Franco, ao final, esclarece que «a formação doutrinal, a formação filosófica é muito importante diante de conflitos e na ausência de conflitos. Uma pessoa mais formada e bem formada tem o olhar sobre a realidade, em princípio mais profundo, mais sereno, mais equidistante».

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